Natal é festa familiar. É o momento de encontros, de rever quem não se consegue tempo para ver durante o ano. De tentar conviver por uma noite até com os que não são nosso afetos mais profundos. Eu passei natais deliciosos em minha vida onde a reunião familiar estava sempre presente.
Lembro-me da “mesa das crianças” na
casa de minha avó, quando eu, meus dois primos e minha prima nos ajoelhávamos
em volta da mesinha de centro enquanto os adultos se sentavam todos à mesa
principal – meu avô fazia questão, nada de jantar à americana, com pratos no
colo.. Nossa briga infantil era sempre
pelas coxas do peru que, invariavelmente, ficavam para os dois meninos, restando
a nós, meninas, nos contentarmos com as asas. Eu daria tudo por um peru quadrúpede!
Algumas vezes passávamos o reveillon
na casa de minha outra tia, irmã de meu pai. Uma festa diferente, com mais
gente. Sempre tinha alguém tocando violão e amigos que eu não conhecia. Lá eu
era a única criança. Era a época dos canapês e me lembro de nos reunirmos, as
mulheres da família, para fazer os petiscos um a um. Eu adorava cortar o pão de
forma com o copo, passar maionese e decorar com pedacinhos de azeitonas,
queijo, tomate , fazendo enfeites. Era um exercício de criatividade.
Nos últimos anos, passar a noite de
24 na casa de minha tia tem sido minha alegria, pela oportunidade de estar com
minha família – e já não brigamos mais pelas pernas do emplumado! Agora falamos
da vida, contamos coisas, observamos como nossos filhos cresceram e dividimos
recordações.
Nem tudo foram flores e poucas vezes as
festas foram totalmente tranquilas em minha infância e adolescência. Meu pai
tinha problemas com bebida – eufemismo da época para falar sobre alcoolismo - e
as festas de fim de ano eram sempre um gatilho para suas crises.
Mas quando penso nos festejos de
minha infância, nunca é disso que me lembro.
Foi meu pai quem me ensinou a ter uma
relação diferente com os presentes. Talvez porque o orçamento não nos permitisse
ter o objeto dos sonhos, ele valorizava a forma da entrega. Pacotes escondidos
para que eu achasse, cartões com dizeres valiosos... Dos bons presentes, lembro-me
de um rádio gravador usado que ganhei. Ele o colocou em um canto sem que eu
visse e ligou para gravar. Depois de me fazer conversar alguns minutos, voltou a
fita e apertou o play. Levei um susto ao ouvir minha própria voz vinda do fundo
da sala! Alguns anos antes, ganhei minha bicicleta, usada também, que foi
escondida na casa. Mais tarde estávamos
todos na sala e papai me pediu para pegar algo na cozinha. Com medo do escuro,
fui e voltei correndo, nem ascendi a luz. Fizeram-me voltar e clarear o cômodo.
Minha reação foi de incredulidade: “De quem é esta bicicleta?”. Da bike lembro
pouco, mas a alegria da surpresa ficou marcada para sempre.
Minha mãe tinha especial talento para
preparar brincadeiras para festas. Algumas eram adaptadas das confraternizações
de encerramento de ano da empresa onde ela trabalhava, a DuPont. Outras, ela
mesma criava. Como passávamos todos o natais na casa de alguém, nem sempre ela tinha oportunidade de aplicar
suas ideias. Quando me casei e passei a fazer minhas ceias, pude usar várias de
suas brincadeiras e aprendi a inventar outras.
Meus pais me ensinaram, cada um a seu
modo, que confraternização de fim de ano não é só sobre comidas e presentes. É
sobre criar recordações que aquecem o coração. Sobre dar amor, ser afetuoso,
proporcionar alegria – coisas que o aniversariante da data nos veio ensinar.
Procurei passar isso para frente. Nossas
comemorações hoje em dia são recheadas de experiências bem nossas, pequenas
coisas que nos identificam como grupo familiar. Este ano fizemos biscoito de
gengibre, como aqueles dos filmes - uma tradição americana que Hollywood
espalhou para o mundo - uma forma divertida de unir familiares, dar risadas,
ter assunto e de plantar lágrimas de alegria e saudade quando, daqui a alguns
anos, virarem histórias para filhos e netos.