quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

Natal em família

Natal é festa familiar. É o momento de encontros, de rever quem não se consegue tempo para ver durante o ano. De tentar conviver por uma noite até com os que não são nosso afetos mais profundos. Eu passei natais deliciosos em minha vida onde a reunião familiar estava sempre presente.

Lembro-me da “mesa das crianças” na casa de minha avó, quando eu, meus dois primos e minha prima nos ajoelhávamos em volta da mesinha de centro enquanto os adultos se sentavam todos à mesa principal – meu avô fazia questão, nada de jantar à americana, com pratos no colo..  Nossa briga infantil era sempre pelas coxas do peru que, invariavelmente, ficavam para os dois meninos, restando a nós, meninas, nos contentarmos com as asas. Eu daria tudo por um peru quadrúpede!

Algumas vezes passávamos o reveillon na casa de minha outra tia, irmã de meu pai. Uma festa diferente, com mais gente. Sempre tinha alguém tocando violão e amigos que eu não conhecia. Lá eu era a única criança. Era a época dos canapês e me lembro de nos reunirmos, as mulheres da família, para fazer os petiscos um a um. Eu adorava cortar o pão de forma com o copo, passar maionese e decorar com pedacinhos de azeitonas, queijo, tomate , fazendo enfeites. Era um exercício de criatividade.

Nos últimos anos, passar a noite de 24 na casa de minha tia tem sido minha alegria, pela oportunidade de estar com minha família – e já não brigamos mais pelas pernas do emplumado! Agora falamos da vida, contamos coisas, observamos como nossos filhos cresceram e dividimos recordações.

Nem tudo foram flores e poucas vezes as festas foram totalmente tranquilas em minha infância e adolescência. Meu pai tinha problemas com bebida – eufemismo da época para falar sobre alcoolismo - e as festas de fim de ano eram sempre um gatilho para suas crises.

Mas quando penso nos festejos de minha infância, nunca é disso que me lembro.  

Foi meu pai quem me ensinou a ter uma relação diferente com os presentes. Talvez porque o orçamento não nos permitisse ter o objeto dos sonhos, ele valorizava a forma da entrega. Pacotes escondidos para que eu achasse, cartões com dizeres valiosos... Dos bons presentes, lembro-me de um rádio gravador usado que ganhei. Ele o colocou em um canto sem que eu visse e ligou para gravar. Depois de me fazer conversar alguns minutos, voltou a fita e apertou o play. Levei um susto ao ouvir minha própria voz vinda do fundo da sala! Alguns anos antes, ganhei minha bicicleta, usada também, que foi escondida  na casa. Mais tarde estávamos todos na sala e papai me pediu para pegar algo na cozinha. Com medo do escuro, fui e voltei correndo, nem ascendi a luz. Fizeram-me voltar e clarear o cômodo. Minha reação foi de incredulidade: “De quem é esta bicicleta?”. Da bike lembro pouco, mas a alegria da surpresa ficou marcada para sempre.

Minha mãe tinha especial talento para preparar brincadeiras para festas. Algumas eram adaptadas das confraternizações de encerramento de ano da empresa onde ela trabalhava, a DuPont. Outras, ela mesma criava. Como passávamos todos o natais na casa de alguém,  nem sempre ela tinha oportunidade de aplicar suas ideias. Quando me casei e passei a fazer minhas ceias, pude usar várias de suas brincadeiras e aprendi a inventar outras.

Meus pais me ensinaram, cada um a seu modo, que confraternização de fim de ano não é só sobre comidas e presentes. É sobre criar recordações que aquecem o coração. Sobre dar amor, ser afetuoso, proporcionar alegria – coisas que o aniversariante da data nos veio ensinar.

 Procurei passar isso para frente. Nossas comemorações hoje em dia são recheadas de experiências bem nossas, pequenas coisas que nos identificam como grupo familiar. Este ano fizemos biscoito de gengibre, como aqueles dos filmes - uma tradição americana que Hollywood espalhou para o mundo - uma forma divertida de unir familiares, dar risadas, ter assunto e de plantar lágrimas de alegria e saudade quando, daqui a alguns anos, virarem histórias para filhos e netos.

 


sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

Um Natal Sustentável

 


Diz a lenda que o primeiro Papai Noel foi São Nicolau que, na região onde é hoje a Turquia, na segunda metade do século III, ajudava secretamente os mais necessitados. Certa vez, jogou saquinhos de moedas pela chaminé, para ajudar três irmãs a terem seus dotes de casamento, evitando que acabassem na prostituição para se sustentarem. Daí a ideia da entrada triunfal nos lares do planeta aproveitada pela mídia, séculos depois.

Em que momento da história o bom velhinho deixou de suprir o necessário para ser o símbolo do consumo exagerado?

Não há dúvida que o Natal ainda é a época em que se pratica mais solidariedade – a ponto de, às vezes, parecer que no resto do ano pessoas carentes não tem necessidades de vestuário e alimento. Mas, cada vez mais, é o exagero que impera nesta data.

Segundo o Instituto Akatu, 30% do lixo gerado durante o ano, no Brasil, é composto por embalagens. Imagine como isso se multiplica em dezembro. Você já deve ter observado as lixeiras, do lado de fora de prédios e casas, no dia 26 de dezembro: um sem número de caixas de brinquedos e eletrodomésticos, plásticos de embalagens, isopores de todos os tamanhos...

Em tempos de cuidado com o meio ambiente, é urgente pensar em como reduzir todo esse exagero.

Avalie: A ceia precisa mesmo ter tanta comida, que pode acabar indo para o lixo? Precisamos começar a aprender medidas mais exatas para os alimentos. A abundância já não é tanta e o desperdício não tem mais lugar em nossa rotina. E com as restrições da pandemia, teremos que nos adaptar mesmo a mesas menores.

Os presentes modernos podem ser do tipo “vale-compras”, assim você tem certeza de que não acabará guardado numa gaveta, sem uso. Ou do tipo “virtual”. Por exemplo, o acesso a um curso, ingressos para eventos, e-books, reservas em restaurantes ou hotéis, viagens... Presentear experiências é enriquecedor.

Mas se a opção for mesmo um presente tradicional, que tal substituir a embalagem por uma ecobag (sacola) de pano, que poderá ser usada depois, transformando um presente em dois. Ou embalar com papel reciclado de outros presentes, criar uma arte com papeis de revista e jornais, driblando, assim, o grande vilão que é o uso único de objetos descartáveis.

Incentivar essa consciência nas futuras gerações é, talvez, a tarefa mais importante dos adultos de nossa era. As crianças são o maior alvo do consumo nesta época. Ensiná-las a consumir com responsabilidade é um desafio que não pode ser abandonado.  Ajudá-las a entender o valor de presentes artesanais, a necessidade de se doar o que não se usa, criar a cultura de presentes compartilhados (avós e pais se unem para um presente muito bacana), orientá-las no descarte responsável das embalagens, são atitudes importantes para a formação dos cidadãos de amanhã.

É fundamental que não liguemos o “piloto automático”, fazendo tudo como sempre se fez. Nosso mundo precisa, urgentemente, de soluções. E algumas delas podem estar dentro do saco do Papai Noel.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

O exercicio de dar e receber


 Chegou o fim de ano e a época da troca de presentes. Mesmo em meio à crise e com toda a quarentena, ela acontece de alguma forma. Presentes são fontes de alegria. Ou deveriam ser. Mas nem sempre é assim. 

Muitas vezes, a expectativa atrapalha o processo. Nem todo mundo sabe escolher presentes. No amigo oculto, é um problema. Conheço gente que não gosta de participar porque tem medo de dar algo caro e especial e receber uma coisinha qualquer. Ainda que se estipule uma quantia a ser gasta, ainda que se restrinja a chocolate ou que se dê lista de opções, alguém sempre acaba insatisfeito. 

A intenção do presentear foi se perdendo no tempo. 

Minha mãe fazia crochê como ninguém, mas nunca gostou de dar uma peça feita por ela em aniversários ou natais. Achava que o presenteado ía “reparar” se ela não desse um artigo de loja. Não adiantava dizer a ela que sua peça, numa loja, valeria bem mais do que o presente comprado. É a velha discussão preço versus valor. A vida moderna nos instiga a reduzir tudo a cifrões. Como dizia aquela propaganda, há coisas que não tem preço. E são as melhores.

Lembro-me de um texto que li há alguns anos sobre uma pessoa que, ao receber um jovem morador de rua pedindo alimento a sua porta, puxou conversa, perguntou-lhe da vida. Depois de alguns minutos de papo, ele se despediu. “Espere que vou buscar o pão que me pediu”, disse ela. Ele, já saindo, respondeu: “Precisa não. A senhora conversou comigo. Fiquei feliz”. 

Em minha casa, neste ano, decidimos fazer um amigo oculto de experiências. Funciona assim: os presentes deverão ser vividos. Coisas tipo ingressos de cinema, uma tarde em um café, um almoço de domingo num restaurante, uma pequena viagem... Além de privilegiar esses setores da economia mais prejudicados na pandemia, evitamos o culto ao consumismo. Iniciaremos 2021 com menos objetos e mais encontros. E como estamos precisados de encontros!

Quero, a partir deste Natal, resgatar o verdadeiro sentido do presentear: agradecer o tempo que meu amigo tirou, em sua rotina diária, para pensar num presente para mim. 

Vamos também?

E muita empatia com a inabilidade alheia. 

Feliz dezembro!